Espaço: Como Juno levantará o véu de nuvens para desvendar Júpiter

A sonda Juno, da Nasa, adentrou o desconhecido, penetrando profundamente o coração cheio de radiação do sistema de Júpiter em uma tentativa ousada de desvendar os segredos da origem do gigante de gás.

Essa missão ambiciosa pode transformar completamente nosso entendimento de como o maior planeta do sistema solar apareceu – e como ele influenciou a evolução de outros planetas. Mas isso será possível somente se Juno sobreviver aos perigos de explorar um ambiente onde nenhuma sonda havia ousado entrar.

Antes, somente a missão Galileu havia orbitado Júpiter, ao investigar a atmosfera conturbada e cheia de nuvens em 1995. Apesar de seu sucesso, permanecem enormes buracos em nosso conhecimento da formação de Júpiter e se ele contém um núcleo planetário remanescente dos primórdios do sistema solar. A poderosa gravidade de Júpiter prendeu para sempre o material do qual ele se formou, fazendo dele uma cápsula do tempo enorme na qual estão gravadas as condições que existiam quando nosso sistema solar era jovem.

A formação desse planeta gigante teve papel crucial na formação da arquitetura do sistema solar como ele é hoje. Com sua imensa gravidade, Júpiter poderia ter sido um destruidor ou um salvador. Seus movimentos primordiais no jovem sistema solar poderiam ter destruído os mundos terrestres que se formavam, levando a colisões cataclísmicas que ameaçariam a existência do planeta Terra.

A gravidade de Júpiter pode ter trazido cometas e asteroides que carregariam ingredientes necessários para a formação da vida em nosso planeta. A história da origem de Júpiter é uma chave para que possamos entender nosso sistema solar e também trabalhar nas hipóteses de que isso tenha acontecido também em outros lugares.

Medições cruciais

Assim como seu equivalente mitológico, que se envolveu por um véu de nuvens para esconder sua maldade, o planeta gigante não irá revelar seus segredos facilmente. O conjunto sofisticado de instrumentos de Juno deve penetrar mais fundo do que antes, para regiões abaixo das agitadas concentrações de nuvens que são invisíveis para os telescópios baseados na Terra. Após uma jornada de cinco anos, a sonda movida a energia solar irá embarcar em uma série de órbitas ao redor do planeta, indo até os polos do planeta e depois adentrando 5.000 quilômetros nas nuvens.

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Júpiter em foto tirada pela Nasa em 2000
Essas passagens permitirão medições precisas da gravidade de Júpiter e de seus campos magnéticos, inferindo sua estrutura interna e sua densidade. Isso irá ajudar a examinar o exótico interior do gigante gasosos, onde o hidrogênio é colocado sob imensa pressão para se tornar metálico e condutor (um estado visto apenas de maneira fugaz em laboratórios na Terra). Essas medições potencialmente forneceriam um primeiro vislumbre de um núcleo, caso ele exista.

Se nossas teorias de formação planetária estiverem corretas, então os elementos mais pesados de Júpiter, como carbono, hidrogênio e enxofre, deveriam ter chegado de um sistema solar jovem como moléculas presas em gaiolas de gelo. Isso deve ter deixado uma enorme quantidade de água em Júpiter, mas na forma de água condensada nas condições frígidas da atmosfera do planeta – nós nunca tivemos uma estimativa confiável de quanta água realmente está lá. Se não houver água o suficiente presente, então a teoria principal sobre a formação de Júpiter teria que ser completamente revista.

Ao longo dos próximos meses, Juno vai responder a essa questão. A sonda carrega instrumento capaz de analisar o planeta em comprimento de micro-ondas, permitindo revelar a distribuição de água abaixo das nuvens. Junto às medições de gravidade, Juno irá descascar as camadas de Júpiter para finalmente testar teorias de como planetas gigantes se formam – um embrião planetário pesado é necessário ou esses mundos gigantescos se formam a partir do colapso de gases cercando uma estrela jovem?

A órbita única de Juno irá fornecer nossa primeira visualização direta dos polos de Júpiter, explorando as poderosas auroras e a atmosfera dinâmica. O conjunto de sensores da sonda giratória (com três rotações por minuto) irá varrer o ambiente radioativo para explorar o imenso plasma e os campos magnéticos. Suas câmeras irão mirar recursos da atmosfera, como tempestades e turbilhões giratórios, em um trabalho de tirar o fôlego. Além dos instrumentos científicos, Juno também carrega a primeira câmera com foco em educação, e o público é convidado a sugerir o foco de observação.

Além disso, um exército de observadores profissionais e amadores, incluindo colegas da Universidade de Leicester, estão engajados em uma campanha internacional para apoiar a missão. Essas observações irão fornecer uma visão global do planeta para permitir observações detalhadas de Juno; revelar como a atmosfera dinâmica de Júpiter muda e observar o planeta em comprimentos de onda de luz que Juno não pode acessar. Um exemplo incrível da capacidade de observatórios baseados na Terra são as recentes imagens capturadas pelo Very Large Telecope (VLT), no Chile.

Mas durante essas observações únicas, a sonda tomará uma surra de partículas de alta energia no cinturão de radiação de Júpiter, o equivalente a 100 milhões de raios-x dentais somente no primeiro ano. Nenhuma espaçonave jamais lidou com condições tão severas. Mesmo com componentes de instrumentos guardados em um cofre de titânio com parede de 1 cm de espessura, ainda haverá dano causado por radiação e degradação do equipamento.

Ninguém sabe exatamente como os instrumentos se sairão de uma batalha árdua e heroica após a conclusão dos 20 meses da missão. Mas uma coisa é certa – o véu de nuvens de Júpiter não continuará a esconder sua maldade, à medida que os instrumentos de Juno observam o coração do gigante pela primeira vez.

Este textoi foi publicado originalmente no site The Conversation. Ele foi escrito por Leigh Fletcher, pesquisador da Royal Society Research na Universidade de LeicesterThe Conversation

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